Resenha Crítica – Trilogia Kafka: A Anatomia do Cárcere e a Estetização da Impotência Resenha Crítica — Trilogia Kafka: A Anatomia do Cárcere e a Estetização da Impotência Por Márcia Boaro Publicado em Os Que Lutam O espetáculo Trilogia Kafka , em cartaz no Teatro Núcleo Experimental, é fruto do trabalho conjunto de Helio Cicero, André Capuano e Pedro Conrado, sob direção e adaptação de Cesar Ribeiro. Mais do que uma montagem que transita entre literatura e cena, trata-se de um projeto dramatúrgico que articula atuação, espaço e pensamento em uma operação estética de alta densidade. Ao escolher quatro textos de Franz Kafka — Diante da Lei, O Artista da Fome, Relatório para uma Academia e Carta ao Pai —, o espetáculo não realiza uma adaptação no sentido tradicional, mas constrói um dispositivo de análise, exposição e desnudamento dos sistemas de opressão que a...

Assistir Foxfinder para que não nos cacem

 Podemos falar em várias “funções” para a arte, uma das mais relevantes é utilizar a obra artística como instrumento para questionar a realidade objetiva, sendo assim o trabalho nos apresenta subsídios que nos auxiliam a vermos traços específicos de um panorama mais amplo, caso não fossem destacados estes detalhes normalmente passariam desapercebidos, mas quando nos são apresentados sob outra ótica vemos que é algo a ser pensado e se for o caso questionado. A questão seria levar a reflexão, não ao convencimento. É como se pudéssemos sair do contexto social em que vivemos e observá-lo como se fossemos estranhos. A criação de distopias é muito utilizada na literatura e na dramaturgia, porque nesta realidade imaginária o ponto a ser ressaltado pode ser ampliado, sob esta lente de aumento vemos o absurdo. Esta explicação é para mostrar os grandes méritos da dramaturga Dawn King em Foxfinder, em 2011 os regimes de extrema direita estavam ensaiando para voltar, mas a autora percebeu que aconteceria, e criou através de uma fábula distópica um microcosmos onde pode mostrar suas ideias, são quatro personagens, o casal Samuel Covey (Ernani Sanchez) e Jude Covey (Carolina Fabri), o inspetor William Bloor (Eduardo Mossri) e a vizinha Sarah Box (Carol Vidotti), através deles diferentes pontos de vistas e proposições são colocadas em cena. A encenação (direção de Wallyson Mota) sempre em um ritmo forte e tão envolvente quanto o texto nos mostra como o autoritarismo pode ser envolvente e sedutor.


Foto de Halei Rembrandt


Em alguns momentos Foxfinder nos lembra de 1984 (de George Orwell) em outros do Conto da Aia (The handmaid´s Tale de Margaret Atwood) duas obras literárias que pela sua força foram transportadas para o cinema ou séries de TV, mas talvez por se tratar também de distopias, no caso a peça de Dawn King tem alguns pontos que a tornam mais interessantes para o público contemporâneo ela foi escrita já para o período atual, um período que está em formação e que deve ser observado pelo público já para que ainda possa ser moldado. Alguns autores entre eles  a teórica americana Jodi Dean (Neofeudalismo: o fim do capitalismo) observa que a dramaturgia atual mostra comunidades autoritárias e em muitos casos agrarias (Game of Thones, Jogos Vorazes, Vikings etc) porque a civilização capitalista esta no fim e outra realidade (pior) se apresenta, uma sociedade semelhante ao feudalismo, a sociedade apresentada em Foxfinder tem uma logica feudal, os pequenos proprietários de terras passam a ser tratados como servos pelo governo central, que utiliza instrumentos de dominação baseados na culpa e na união contra um inimigo comum (construído no imaginário). Outra grande sacada da montagem é deixar claro que os artistas não são as Raposas, não vou explicar mais para não tirar nenhuma surpresa do espetáculo, que deve ser visto.

Teatro Sérgio Cardoso – Sala Paschoal Carlos Magno

FOXFINDER

De 02/05 a 14/06 | Segundas e terças-feiras, às 19h (Gratuito)

 

 

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