Resenha Crítica – Trilogia Kafka: A Anatomia do Cárcere e a Estetização da Impotência Resenha Crítica — Trilogia Kafka: A Anatomia do Cárcere e a Estetização da Impotência Por Márcia Boaro Publicado em Os Que Lutam O espetáculo Trilogia Kafka , em cartaz no Teatro Núcleo Experimental, é fruto do trabalho conjunto de Helio Cicero, André Capuano e Pedro Conrado, sob direção e adaptação de Cesar Ribeiro. Mais do que uma montagem que transita entre literatura e cena, trata-se de um projeto dramatúrgico que articula atuação, espaço e pensamento em uma operação estética de alta densidade. Ao escolher quatro textos de Franz Kafka — Diante da Lei, O Artista da Fome, Relatório para uma Academia e Carta ao Pai —, o espetáculo não realiza uma adaptação no sentido tradicional, mas constrói um dispositivo de análise, exposição e desnudamento dos sistemas de opressão que a...

"O Figurante" – A Poética da Invisibilidade

Na solidão de um palco nu, Mateus Solano encarna Augusto em seu primeiro monólogo, um figurante apaixonado pelo que faz, mas eternamente à margem, preso a uma existência que não lhe concede o desejo de exercer plenamente o ofício de ator. Entre sonhos e funções que parecem nunca se concretizar, Augusto luta por dignidade em um mundo que o silencia, onde cada tentativa de "ir além" é anulada pela indiferença. Há em sua jornada ecos das peças de Franz Xaver Kroetz, com suas paisagens de cotidiano vazio, que expõem a banalidade como um reflexo profundo da condição humana.

Sob a direção sensível de Miguel Thiré, "O Figurante" transforma essa luta silenciosa em poesia cênica. A dramaturgia, fruto da colaboração entre Isabel Teixeira, Mateus Solano e Miguel Thiré, apresenta um texto que flui como um sopro de improviso refinado, carregando a autenticidade das reflexões do personagem. Cada palavra dita, cada silêncio entrecortado, revela camadas de um homem que, em sua invisibilidade, reflete todos nós.




Mateus Solano demonstra, com maestria, a maturidade de um ator que domina o espaço cênico e a palavra. Sua atuação é um jogo de contrastes: a leveza dos movimentos mímicos e a densidade emocional de quem vive à sombra. Ele transita por diferentes formas de interpretação, construindo personagens dentro de um personagem, ampliando o alcance poético e político do espetáculo.

O palco vazio não é ausência, mas um convite à imaginação, preenchido pela luz precisa de Daniela Sanches e pelos sons de João Thiré, que sublinham, sem exageros, a solidão de Augusto. A direção de movimento de Toni Rodrigues amplifica a fisicalidade do personagem, enquanto o texto se desenha no ar, em respirações e pausas, como Isabel Teixeira bem descreve.

"O Figurante" é mais do que uma história de um homem sem reconhecimento; é um retrato da invisibilidade cotidiana. A peça nos interpela: quantas vezes somos figurantes de nossas próprias histórias? Quantas vezes nossos gestos, tão cheios de sonhos e intenções, passam despercebidos?

Mateus Solano, Miguel Thiré e Isabel Teixeira entregam um espetáculo delicado, técnico e emocionalmente rigoroso, que não apenas conta uma história, mas nos lembra do poder do teatro como espaço de reflexão e encontro humano.

Assim, "O Figurante" não brilha pelos excessos, mas pela sutileza. É teatro em sua essência, onde o invisível se torna visível, e o que é deixado de lado ganha o centro do palco. Uma obra que nos convida a ouvir as vozes que costumamos ignorar – as dos outros e as nossas próprias.

Ficha Técnica: 
Dramaturgia: Isabel Teixeira, Mateus Solano e Miguel Thiré. Atuação: Mateus Solano. Direção: Miguel Thiré. Direção de Produção: Carlos Grun. Direção de Movimento: Toni Rodrigues Desenho de Luz: Daniela Sanches. Direção Musical e Trilha Original: João Thiré. Design Gráfico: Rita Ariani. Desenho de Som: João Thiré. Fotos: Guto Costa. Equipe de Produção: Flavia Espírito Santo, Glauce Guima, Kakau Berredo e Cleidinaldo Alves. Idealização e Realização: Mateus Solano, Miguel Thiré e Carlos Grun. Produção: Bem Legal Produções. Assessoria de Imprensa: Adriana Balsanelli. 

Classificação: 12 anos
Temporada: Em cartaz de janeiro a março
Apresentação: Sextas: 21h; Sábados: 19h; Domingos: 17h
Duração: 70 minutos
Gênero: Comédia Dramática
Ingressos: R$ 150,00

BILHETERIA SEM COBRANÇA DE TAXA
+55 11 3069-2286 +55 11 99738-1234
Sexta, Sábado e Domingo, das 14h até o início do espetáculo.





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